3. Atenuação das alterações climáticas
Por que motivo que a mitigação das alterações climáticas no setor do turismo é tão importante?
O turismo é um setor em crescimento, graças ao constante aumento do número de turistas que viajam pelo mundo fora. Por exemplo, em 1950 era de cerca de 25 milhões, enquanto em 2015, o mercado turístico cresceu para cerca de 1,2 mil milhões. De acordo com as previsões da Organização Mundial do Turismo da ONU, em 2030 este número aumentará para cerca de 1,8 mil milhões de pessoas. Mas o crescimento do turismo tem um efeito significativo sobre o ambiente. As estimativas mostram que 5% das emissões globais de CO2 podem ser associadas às atividades na área do turismo, dos quais 20% são libertos por hotéis e outros locais de alojamento [1].
Existem mais de 80 tipos de alojamento distintos, incluindo hotéis, albergues, motéis, pousadas, alojamentos self-catering, parques de campismo. O consumo de energia nestes locais está relacionado com aquecimento, arrefecimento, iluminação, limpeza, cozinha, dessalinização (água do mar em regiões tropicais ou secas). O consumo médio de energia varia, dependendo do tipo de alojamento (Tab. 1).
Tabela 1. Consumo médio de energia versus emissões de vários locais de alojamento [2]
Tipo de alojamento | Utilização de energia por noite de hóspedes (MJ) | Emissões por noite de hóspedes (kg CO2) |
Hotéis | 130 | 20.6 |
Self-catering | 120 | 19.0 |
Aldeias de férias | 90 | 14,3 |
Alojamento de férias | 100 | 15,9 |
Parques de campismo | 50 | 7,9 |
Pousadas | 25 | 4,0 |
Vale a pena notar que as operações no setor do turismo (incluindo hotéis) implicam um impacte ambiental inevitável, contribuindo para as alterações climáticas. No entanto, devem ser feitas tentativas de mitigação através de várias ações para prevenir ou reduzir o impacte ambiental negativo das operações hoteleiras. Estas atividades podem trazer benefícios não só para o ambiente, mas também para todo o setor do turismo. O clima é uma vantagem fundamental para o turismo, pelo que as alterações ambientais e os fenómenos meteorológicos extremos resultantes (por exemplo, ondas de calor, chuvas fortes, tufões, furacões) podem ter um efeito negativo neste setor. O que no que lhe concerne, pode mesmo impossibilitar o seu funcionamento [2] (Tab. 2).
Os efeitos negativos mais frequentes das condições meteorológicas extremas para o turismo (incluindo hotéis e outros locais de alojamento) são: danos nas infraestruturas, interrupções nas operações e custos operacionais mais elevados relacionados com seguros, sistemas de abastecimento de água e eletricidade de reserva, bem como evacuação. As instalações de alojamento devem, portanto, estar preparadas para satisfazer requisitos adicionais em termos de prontidão de emergência. Entre as cidades mais vulneráveis às mudanças ambientais resultantes das alterações climáticas, encontram-se as localizadas em regiões montanhosas e costeiras e também em ilhas [2]. Um dos exemplos do efeito negativo das condições meteorológicas é o hotel New Honeymoon no Paquistão, localizado na margem do rio Swat. A 26 de agosto de 2022, foi atingido por uma enorme onda de inundações e entrou em colapso. Felizmente, não houve vítimas mortais porque todos os hóspedes tinham sido evacuados antes da água das cheias chegar ao hotel e aos edifícios circundantes. Tudo aconteceu devido ao período da oitava monção que causou inundações no Paquistão. O ministro paquistanês do clima, Sheryy Rehman, mencionou as alterações climáticas como uma das causas desta situação [5].
Tabela 2. Exemplos de impacte negativo das condições climáticas extremas causadas pelas alterações climáticas no setor do turismo [2].
Condições meteorológicas | Implicações para o turismo |
Temperaturas mais elevadas | – sazonalidade alterada
– stress térmico para turistas – custos de arrefecimento mais elevados |
Frequência e intensidade crescentes de tempestades extremas | – risco para instalações turísticas
– aumento dos custos de seguro/perda de segurança – custos de interrupção de negócios |
Redução da precipitação e aumento da evaporação em algumas regiões | – falta de água
– concorrência sobre a água entre o turismo e outros setores – risco de incêndios e danos nas infraestruturas e menor procura |
Aumento da frequência de precipitação forte em algumas regiões | – sazonalidade alterada
– danos nas infraestruturas turísticas |
Cobertura de neve decrescente e degelo dos glaciares | – estações desportivas de Inverno mais curtas
– falta de neve nos destinos dos desportos de Inverno – aumento dos custos de produção de neve |
Incêndios florestais mais frequentes | – danos nas infraestruturas turísticas
– aumento do risco de inundação |
A mitigação das alterações climáticas é, portanto, importante, tanto em termos de proteção ambiental, como para o setor do turismo, para tal a prevenção de fenómenos climáticos extremos é fundamental para o bom funcionamento e segurança das instalações de alojamento.
Mitigar as alterações climáticas em hotéis e outros estabelecimentos de alojamento
Em 2022, o Conselho Mundial de Viagens e Turismo (CMVT) publicou o documento Hotel Sustainability Basics. Trata-se de um conjunto de indicadores de sustentabilidade, reconhecidos mundialmente, incluindo 12 ações vitais para a sustentabilidade hoteleira. Estas 12 ações cobrem três áreas principais: eficiência, Planeta e Pessoas. Duas são relevantes em termos de mitigação das alterações climáticas: Eficiência e Planeta (Fig. 7).
A principal tarefa dos hotéis em termos de mitigação das alterações climáticas deve ser a prevenção ou redução das emissões de gases com efeito de estufa (GEE). Nesta área, os estabelecimentos de alojamento devem concentrar-se principalmente em três estratégias: poupar energia, melhorar a eficiência energética e mudar para energias renováveis (Fig. 8).
Figura 7. Ações propostas pelo CMVT que podem ajudar os hotéis a reduzir o seu efeito ambiental negativo e a mitigar as alterações climáticas [6]
O primeiro passo para os hotéis reduzirem o consumo de energia deveria ser a elaboração de um historial de consumo, centrado em como a energia é utilizada numa determinada instalação e quais os custos gerados. A análise deveria abranger vários anos para verificar não só o consumo de energia em condições normais de funcionamento, mas também as suas variações e as razões pelas quais tal acontece. Uma auditoria energética independente é também uma boa prática. Permite a verificação objetiva do perfil de consumo de energia de uma dada instalação, incluindo os custos relacionados, bem como a identificação das principais fontes de aumento do consumo.
O consumo de energia no setor do alojamento está mais frequentemente relacionado com o aquecimento e arrefecimento, especificamente aquecimento central, utilização de frigoríficos e congeladores, fornecimento de água quente, ar condicionado e iluminação. Nas regiões mais quentes, a maioria da energia é utilizada por sistemas de ar condicionado. Um menor consumo de energia dos sistemas de ar condicionado poderia ser alcançado através da implementação de certas soluções para reduzir sempre que possível o recurso ao mesmo. Para tal:
- manter a temperatura nos quartos entre 20-25ºC (o hotel Hilton Seychelles realizou uma experiência que demonstrou que os hóspedes aprovaram a temperatura de 25ºC sem quaisquer queixas);
- conceber os hotéis tendo em conta a melhor localização possível (por exemplo, possibilidade de plantar ou manter a vegetação já existente à volta dos edifícios em regiões tropicais ou muito quentes, para proporcionar sombra e temperatura interior mais baixa) ventilação natural (por exemplo, através das janelas) ou isolamento;
- adequar a localização dos sistemas de ar condicionado e aquecimento para evitar uma utilização ineficiente ou um fluxo de ar quente para áreas mais frias;
- utilizar os termóstatos para sistemas de aquecimento ou arrefecimento, o que permitiria a ativação imediatamente antes da chegada dos hóspedes;
- colocar os sistemas de ar condicionado ou aquecimento a funcionar por turnos em salas;
- utilizar os dispositivos de automização para sistemas de ar condicionado (desativação ao abrir a porta ou janelas);
- respeitar as instruções de manutenção dos filtros e bobinas das unidades AVAC (o London Marriot County Hall no Reino Unido conseguiu reduzir o consumo de energia nos quartos de hotel em 37% graças a uma limpeza adequada das unidades de ar condicionado).
Restaurantes vs. refrigeração (armazenamento de alimentos)
Os restaurantes de hotel podem implementar algumas das soluções listadas, e adicionalmente:
- modificar o menu para oferecer refeições feitas de produtos locais, o que permitiria reduzir as emissões relacionadas com o transporte de produtos (particularmente nas regiões onde os produtos alimentares são entregues por via aérea);
- confecionar pratos de produtos certificados ecologicamente, uma vez que a sua produção tem um menor impacte negativo no ambiente;
- reduzir o número de pratos de carne na ementa é uma boa prática, uma vez que a sua produção implica maiores emissões do que as refeições de vegetais, Clima 2008, pp. 173;
- ajustar a temperatura do frigorífico para 4-7ºC;
- definir a temperatura da arca frigorífica entre -18ºC e -15ºC;
- deixar os alimentos quentes a arrefecer antes de serem colocados no frigorífico ou congelador;
- deixar espaço entre os artigos mantidos no frigorífico (evitar o enchimento excessivo) porque o fluxo de ar aumenta a eficiência de refrigeração;
- verificar regularmente as portas de frigoríficos para uma montagem adequada e condições de selagem;
- descongelar regularmente as arcas frigorificas porque o gelo acumulado reduz a eficiência do congelamento;
- verificar e limpar regularmente os condensadores, ventiladores e compressores;
- apertar devidamente as correias do compressor da arca frigorífica.
Duches, piscinas e lavandaria
Os duches, piscinas e lavandaria dos hotéis podem gerar cerca de 50% dos custos de energia. A redução do consumo de energia nestas áreas passa por:
- regular a temperatura da água, não devendo exceder 60ºC (o que permite reduzir a energia necessária para aquecer água);
- instalar chuveiros de baixo caudal;
- utilizar equipamento de poupança de energia (por exemplo, máquinas de lavar roupa);
- instalar sistemas de aquecimento solar de água;
- utilizar economizadores de caldeira ou permutadores de calor (o YHA Wellington Hostel, na Nova Zelândia, instalou um permutador de calor que recupera o calor dos canos de drenagem dos chuveiros e transfere o calor residual para a água fria de entrada, reduzindo os custos dos chuveiros quentes em 50%);
- utilizar aquecedores solares de água ou coberturas para as piscinas;
- utilizar bombas de calor também para piscinas, reduzindo o consumo de energia para cerca de 53%.
Iluminação
- conceber os hotéis tendo em conta a melhor utilização possível da luz do dia (por exemplo, em regiões de clima moderado e no hemisfério norte deve ser evitada a plantação de árvores próximo do edificado ou devem ser podadas à medida que reduzem o acesso solar);
- utilizar iluminação economizadora, por exemplo, lâmpadas economizadoras de energia e lâmpadas LED;
- utilizar sensores de movimento em partes comuns do hotel e também nos quartos para evitar o uso constante de iluminação;
- utilizar cartões para apagar a luz e outros equipamentos, quando os hóspedes saem do quarto [2].
Outras ações a serem implementadas em hotéis e outros estabelecimentos de alojamento para mitigar as alterações climáticas
- incluir no preço do alojamento (estâncias de esqui) [7] a viagem de autocarro até aos elevadores de esqui; [8]
- gerir um serviço de aluguer de bicicletas de hotel (para reduzir o transporte individual de automóvel);
- incentivar os hóspedes ou colaboradores a apresentar as suas ideias sobre como o hotel pode reduzir o efeito negativo no ambiente (por exemplo, utilizando uma caixa colocada na receção ou no website do hotel);
- encorajar os hóspedes a poupar água e energia através da renúncia voluntária do serviço de quarto diário (como compensação, os hóspedes podem receber cupões de pequeno valor para snacks e bebidas a serem utilizados num restaurante de hotel); [7]
- encorajar os turistas a passar mais tempo no local, para reduzir a pegada de carbono;
- organizar de videoconferências (turismo de negócios);
- implementar de um sistema de gestão ambiental conforme a ISO 14001 ou EMAS, útil na atividade ambiental a longo
A utilização de fontes de energia renovável também deve ser considerada. Várias fontes energias renováveis podem ser aplicadas no setor do turismo, incluindo fotovoltaica, eólica, geotérmica, painéis solares, biomassa e resíduos. A energia solar/térmica pode ser utilizada para o aquecimento de água e de interiores. Os aquecedores solares de água, dependendo da localização, podem satisfazer até 50% da procura anual de água quente de um alojamento, sendo apenas necessário a utilização de outro sistema em dias nublados ou durante o inverno. Outra fonte de energia renovável popular é a fotovoltaica, utilizada para a produção de energia elétrica a partir da radiação solar. Os sistemas fotovoltaicos são fáceis de utilizar e irão funcionar na maioria dos locais. No entanto, devem ser instalados para permitir captar o máximo de luz solar. A energia renovável (principalmente a energia eólica) pode ser utilizada por estâncias de esqui para fazer neve ou para operar elevadores de esqui [2].
Resumo
A tomada de medidas para mitigar as alterações climáticas é vital atualmente também no setor do turismo. As alterações climáticas resultam em condições meteorológicas extremas que podem ser muito perigosas para o setor do turismo, prejudicando ou impedindo as suas operações. Os hotéis, um subsetor importante do turismo, devem, portanto, tomar medidas para reduzir o seu impacte negativo sobre o ambiente. As atividades hoteleiras devem concentrar-se principalmente na redução das emissões de CO2, o que pode ser conseguido através da redução do consumo de energia, da melhoria da eficiência energética e da utilização de fontes de energia renováveis. Existem várias soluções específicas que podem ser implementadas – tal como apresentadas anteriormente e mencionadas nos websites dos hotéis. Vão desde tarefas dispendiosas e demoradas até ações menos complexas e menos exigentes do ponto de vista financeiro. Um ponto de partida para implementar tais soluções num hotel deve ser uma análise preliminar do consumo de energia, áreas relacionadas com um maior consumo, bem como soluções viáveis, tendo em conta as capacidades do hotel em termos de disponibilidade e capacidade financeira. Questões para reflexão: Quais são as principais estratégias dos hotéis para mitigar as alterações climáticas? Liste as ações de eficiência propostas pelo CMVT? |